quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Reviravolta - Parte 2

Acaso

Mesmo trabalhando como uma repórter freelancer fixa em uma revista de cultura, as contas continuavam chegando e o cartão de crédito estava prestes a estourar. Não tive outra alternativa, procurei mais freelancers para fazer. Entrei em contato com o meu networking para ver se conseguia algum trabalho em reportagens ou mesmo de revisão
- Olha, Kika, acredito que posso ajudá-la, disse Daisy. Mas é frila na área de farmácia. Você toparia?
- Claro que topo, respondi sem hesitar.
- Beleza, como está a sua quinta?
- Hum...meio lotadinha, preciso entregar duas matérias e tenho uma entrevista com um figurão da música.
- Então deixamos para sexta? Vou estar em fechamento, mas fica fria que aviso a Marta que você irá lá. Ela é gente finíssima. Uma das melhores editoras-chefes que já trabalhei.
- Oba, Daisy!! Que horas então?
- Pode ser às 14:30 hs?
- Combinado! Me passa o endereço!
No dia marcado, cheguei na editora mais cedo do que previsto. Na recepção, fui atendida por uma moça simpática que anunciou a minha chegada à editora-chefe. Sentei-me em um sofá macio e logo peguei uma revista para conhecer mais sobre as publicações, mesmo tendo visitado o site da empresa.
Quando o vi, mal podia acreditar em meus próprios olhos. Lá estava ele, na minha frente, ou melhor, na revista. A foto mostrava um homem sorridente, com alguns cabelos grisalhos que davam um charme ainda maior à sua figura. Realmente, além de bonito, ele era fotogênico. Giovanni era o presidente da empresa e, por sinal, assinava o editorial.
Mas a minha atenção foi atrapalhada pelos barulhos dos saltos de um sapato que tinha um andar persistente e confiante. Levantei meus olhos e assim a vi pela primeira vez, uma mulher magra, alta e de cabelos negros e bem lisos. Tinha olhos sorrateiros e ar triunfante. Tão bonita, quanto antipática. Bem-maquiada e vestida, mas parecia que não saber combinar muito bem as cores.
- Onde está a minha correspondência ? Você checou que horas sai o meu voo ? Ah, sim, por favor, traga água sem gás, e sem gelo, disse enquanto caminhava para a escada. -  E não esqueça de colocar uma rodela de limão, porque você esqueceu de fazer isso a última vez!!!!
A única resposta que escutava da recepcionista, era “sim, senhora”, “sim, senhora”.
Mais tarde fui saber que seu nome era Berenice, a advogada da empresa e possuía algumas ações da editora. Parecia que ela tinha muita influência e algo que ela escondia de forma escusa, o que colaborava para produção de vários boatos.
Foi um alívio ouvir a voz de Marta, muito diferente de Berenice: calma, profissional e sincera. Elogiou os meus textos e disse que conhecia um pouco do meu trabalho. Feito os tratos iniciais comecei a fazer as matérias, até que chegou o período de fechamento. E Marta  pediu-me para ajudá-la, que mais tarde soube que era um costume recorrente com as repórteres e assistentes mais aplicadas.
Lá estava eu, em uma sexta-feira à noite, ajudando a bater as últimas emendas dos textos juntamente com a revisora, enquanto auxiliava os retoques finais com o pessoal da arte.
Estava tentando achar uma nota que coubesse em um vazio de uma matéria sobre um congresso odontológico e foi aí que escutei uma voz inconfundível...
- Boa-noite!! Tudo bem por aqui ?
Levantei os olhos e o vi encarando-me surpreso. A papelada em cima da mesa, o computador com mil janelas abertas, a xícara com resto do chá (detesto café), as olheiras denunciando o quanto estava enlouquecida e envolvida com o trabalho.
- Nossa !! Não esperava por isso nem mil anos!!, disse rindo. Tudo bem com você ? Menos brava comigo? - indagou Giovanni.
Ainda com rosto quente e com coração aos pulos, respondi sem jeito:
- Pois é, a Marta  chamou-me para ajudá-la.
- Isso mostra que ela realmente gosta de você e de seu trabalho. Não é mesmo Marta ?, perguntou com a cabeça voltada para editora-chefe. E ele continuou: -  Como chegou até aqui ?
- Foi a Daisy quem me indicou, uma das repórteres da revista de farmácia.
- Ah, a Daisy !! Aquela maluquinha, Marta, que adora fazer piadas de são paulino ?
- Essa mesmo. Ela é um barato !, respondeu Marta, mas com olha de interrogação como pensasse: “ De onde eles se conhecem?”.
Parecendo adivinhar os pensamentos dela, Giovanni explicou sobre o acidente.
Mais tarde, ele retornou à redação para levar o CD que continha todos os arquivos prontos para rodar na gráfica.
Mas antes de sair, ele disse:
- Fico feliz por saber que você não vai desaparecer – e saiu.
Quando dei-me conta, o meu rosto ficou rubro. E pensei: "não posso ter me apaixonado assim.." Primeiro, que nós se conhecemos em uma situação tão inusitada e segundo, bem..segundo, que no fundo, ele era meu chefe. Retornei para casa de táxi com pessoal da redação, que foi dividida em duas turmas, dependendo da região que morava.
Voltei no mesmo carro com a Marta e vi-me quase a indagando sobre ele, mas segurei-me da forma mais forte que podia, qualquer meio de fazer perguntas sobre sua vida pessoal.
Agitada, cheguei em casa e o procurei nas redes sociais. Lá estava ele. Olhei todo o perfil e confesso que fiquei aliviada quando vi o status de solteiro. Sem pensar muito o chamei para ser meu amigo. E no dia seguinte, para minha surpresa, quando checava meus emails, ele tinha aceitado.
A partir daí, “o vigiava” diariamente. Algumas vezes, ele comentou meus vídeos favoritos, minhas fotos. Tudo com muita educação, um pouco de humor, mas nada de intimidade.
E os dias foram passando. Foi aí que reparei uma loura que muitas vezes conversava com ele ou mesmo deixava recados “engraçadinhos”. A minha primeira reação foi ter ciúmes! Larissa era mais nova que eu, mais bonita, mais magra. Um estilo de modelo, cara de cosmopolita, mas vivia no interior da cidade de São Paulo. Pensava: "Será que no fim eles estão se paquerando ? E se eles começaram a namorar ?". Quando pensava nessa possibilidade todo o meu corpo se retorcia de repulsa, raiva e rancor.
Mas o mundo desmoronou quando em uma manhã fria de domingo, o status dele mudou para “namorando”. Ótimo!!! – pensei: Era tudo que eu não queria!!!. Comecei a chorar e perguntei-me o que estava acontecendo comigo. Mas tive que admitir, estava apaixonada por ele.
Pensei: "Mas quem poderia ser ??". Só devia ser a loura que tanto aparecia nos recados...
Apesar disso, tentava achar uma justificativa que aquilo era apenas para afastar alguma intrusa, maluca. Será que estou invadindo a vida dele ? Será que sou eu a pessoa que ele quer despistar ? Meu estômago doía, a minha cabeça latejava. E os dias que seguiram foram cruéis... A dúvida... sempre ela aparecia e reaparecia... a dúvida...
Mas a resposta veio naquela última sexta-feira do mês, em um fechamento que apesar me rendeu algum dinheiro, também me trouxe uma grande decepção.

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